TEXTO – A FLOR DO GEÓGRAFO Dom Marcos Barbosa O.S.B. Creio que é a terceira vez que ven...

TEXTO – A FLOR DO GEÓGRAFO

Dom Marcos Barbosa O.S.B.


Creio que é a terceira vez que venho falar de motoristas. Até parece que vivo andando de táxi. E tenho sempre a sorte de encontrar no volante, ao contrário dos outros, um verdadeiro gentleman.

Para que não me acusem de suspeição e de especial simpatia pela classe, aviso logo que o fato de hoje não se deu comigo,mas com o professor francês Pierre Desfontaines. Jamais esqueci, porém, a frase obscura que o ilustre geógrafo foi colher na trepidante Paulicéia.

Pierre Desfontaines, cujo nome nos fala de pedra e de fonte, não podia ser, realmente um geógrafo como os outros...

Ah, os geógrafos! Eles eram todos, quase todos, como o geógrafo do Petit Prince, que se contentava em anotar as montanhas, os rios e as cidades que os exploradores houvessem visto; mas não as flores, santo Deus! porque as flores eram efêmeras. Também não lhe interessava se os vulcões estavam extintos ou não. Só queria saber da terra, da montanha. Não do risco corrido pelos homens, tão efêmeros quanto a flor. Anotava tudo a lápis. Só depois cobria à tinta, se o explorador se mostrasse fidedigno e trouxesse provas...

Mas felizmente alguns vieram a descobrir a “geografia humana”, a geografia em função do homem; e eu vim a descobrir, por minha vez, a geografia humaníssima de Desfontaines, que me fez lamentar o árido estudo do meu tempo de ginásio e as áridas geografias que ainda hoje vejo nas mãos de tantos alunos.

O professor Desfontaines está longe de desprezar as coisas efêmeras. E por isso me trouxe a frase de quatro pétalas, que guardei como flor ressequida em velho livro, e que o chofer lhe entregara.

Voltara Desfontaines a São Paulo, onde havia estado anteriormente e morara algum tempo. Tendo contratado um carro para levá-lo não sei onde, reconheceu, ao passar, o sítio da sua antiga casa. Pediu ao chofer que parasse, saltou, foi redescobrir a fachada que lhe sorriu entre as outras, e em cujas janelas viu aparecerem a mulher e as filhas ausentes, mais moça aquela, menos crescidas estas... Viu-se a si mesmo como era, como fora, como havia sido. Até que, caindo em si – ou antes caindo de si – deu com o automóvel que largo tempo o esperava.

Subiu depressa ao carro, bateu a porta, pediu ao chofer que corresse. Quando chegou, atrasado, ao término da viagem e perguntou o preço, viu com surpresa que o chofer pedia o mesmo que antes haviam combinado.

- Mas (protestou Desfontaines) o senhor esteve parado muito tempo; não quero causar-lhe prejuízo!

E foi então que o chofer disse lentamente a sua frase, a sua flor: “Saudades não se pagam...”


Infere-se da leitura do primeiro parágrafo que:

A

os motoristas também eram o tema dos dois textos anteriores do autor;

B

os motoristas são muito criticados por suas grosserias;

C

o autor do texto não possui automóvel próprio;

D

o autor do texto tem como tema de sua coluna os transportes;

E

alguns textos do autor completam textos anteriores.