Ao lado daquilo que os críticos da obra de Gregório de Matos qualificam, irrevogavelmente, de plágios, registramos também, em nossas leituras, temas, frases e procedimentos variados que o poeta foi buscar em outros autores. Em grande parte, trata-se de paródias camonianas ou de outros poetas, sendo visível a intenção do autor de estabelecer um canto paralelo ou um contraponto poético, imitando mais por espírito de emulação e sem ocultar seus desígnios, o que seria impossível, até pela projeção dos modelos. Há, contudo, exemplos expressivos de apropriação, mas como era habitual no poeta: partindo de um núcleo tomado de outro autor, reelaborar o restante, criando um novo poema. Outra maneira de que se valeu para criar em cima do texto alheio foi a paródia.
-
(Adaptado de: GOMES, João Carlos Teixeira. Gregório de Matos, o Boca de Brasa (um estudo de plágio e criação). Petrópolis: Editora Vozes, 1985, p. 90-91)
-
A primeira estrofe de soneto de Gregório de Matos em que se pode identificar “a desconstrução de soneto camoniano com a atitude parodística e intuito humorístico” é:
Carregado de mim ando no mundo
E o grande peso embarga-me as passadas;
Que, como ando por vias desusadas,
Faço o peso crescer, e vou-me ao fundo.
Alma ditosa, que na empírea corte,
Pisando estrelas vais de sol vestida,
Alegres com te ver fomos na vida,
Tristes com te perder somos na morte.
Sete anos a nobreza da Bahia
Servia a uma pastora indiana e bela
Porém serviu à Índia, e não a ela,
Que à Índia só por prêmio pretendia.
Alegre com a empresa desejosa
Corta o Cabo a espessura e busca a via
Não faltando da esquadra criminosa
Algum, que não pudesse neste dia:
Marcha triunfando a gente belicosa,
Pasmam de ver os filhos da Bahia
O sucesso, a prisão, os rebelados,
Cam. As armas e os varões assinalados.
Triste Bahia, oh quão dessemelhante
Estás e estou do nosso antigo estado;
Pobre te vejo a ti, tu a mim empenhado,
Rica te vi eu já, tu a mim abundante.