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___ADULTÉRIO E A DESONESTA ___É comum ouvir que o Brasil é um país onde há leis que peg...

___ADULTÉRIO E A DESONESTA


___É comum ouvir que o Brasil é um país onde há leis que pegam e leis que não pegam, como se isso fosse uma originalidade brasileira como a jabuticaba. É uma injustiça. Há muitos países que sofrem com o mesmo problema. Na Grécia, apenas para ficar num exemplo notório por causa da atenção, dedicada ao país devido às Olimpíadas, existe uma lei óbvia segundo a qual os motoqueiros precisam andar de capacete. Conforme se viu em inúmeras cenas do centro de Atenas, transmitidas pela televisão, os motoqueiros andam por todos os lugares, circulam nas barbas dos guardas de trânsito, mas raramente usam capacete. Na Grécia, a tal lei do capacete não pegou. As leis, principalmente as que interferem na vida cotidiana dos cidadãos, requerem uma sintonia fina entre vários componentes: aparato policial, comportamento coletivo, grau de escolaridade etc. Do contrário, elas tendem a não sair do papel. No Brasil existe muita lei que não pega por falta dessa sintonia. Ou não há polícia suficiente para fazê-la ser cumprida. Ou a lei destoa fortemente de arraigados hábitos coletivos. E assim por diante. O

___Congresso Nacional, a casa das leis, é mestre em embaralhar essa sintonia. Acaba, por exemplo, de avançar mais um passo no sentido de fazer com que o adultério deixe de ser considerado um crime. No Código Penal em vigor desde os anos 40 do século passado, adultério é crime sujeito a penas que podem chegar a seis meses de prisão. O comportamento e os valores da sociedade brasileira ultrapassaram esse dispositivo legal e tornaram-no obsoleto. Condenar alguém, homem ou mulher, por adultério, virou uma piada, embora ainda existam condenações desse tipo de vez em quando nos rincões do país. O Congresso também está se preparando para eliminar do Código Penal a expressão “mulher honesta”, que vem a ser aquela que poderia ser considerada vítima do rapto com propósitos libidinosos – sim, porque a mulher desonesta não poderia ser considerada uma vítima de tal crime... Na década de 40, “mulher honesta” provavelmente queria dizer mulher virgem ou casada e dona-de-casa. Hoje, isso não passa de preconceito tacanho.

___(....) Nesse ritmo, o Congresso vai aprovar o casamento homossexual perto da entrada do quarto milênio, talvez. Sim, porque avanços de comportamento social, tal como o casamento entre pessoas do mesmo sexo, são inexoráveis. São só uma questão de tempo. Mais cedo ou mais tarde tornam-se aceitos – mas o Congresso Nacional, como uma ilha boiando no passado, parece não se dar conta disso. Eis um dos motivos pelos quais há leis que pegam e leis que não pegam.


(André Petry – Veja, 22/09/2004)


O título do texto – "Adultério e a desonesta"– se justifica porque:

A

indica dois conceitos legais ausentes de nosso Código Penal

B

traz dois vocábulos como dois temas independentes no texto

C

mostra o primeiro vocábulo como conseqüência do segundo

D

destaca dois itens que representam conceitos que "não pegaram"

E

estabelece uma relação lógica entre o primeiro e o segundo vocábulo